21 de agosto de 2013

Bagagem


Poucas coisas continha minha pequena mala de fuga. Um vestido velho, chinelos de dedo, um retrato dos bons dias ali vividos, uma fita rosa que outrora enfeitara meu cabelo, um livro gasto e amassado de tão lido e uns cartões postais de lugares onde nunca estivera. Com cuidado, evitando o ranger da porta velha e emperrada do meu quarto, sai com passos bambos de destino incerto.

Deixei minha casa, minha proteção, minha segurança. Sinto que deixei também meu conforto, não que a vida que levava me trouxera qualquer situação de conforto material, mas deixei para trás o conforto da mesmice rotineira que me fizera ser invisível a mim mesma. Deixei meu passado e sai pelo mundo, com coração apertado de angústias por não mais saber todas as respostas e com desejo atormentador por descobrir novas perguntas. Perguntas que nem mesmo sabia existir e era atrás delas que saia naquela manhã nublada e fria. 

No início da caminhada via as mesmas ruas e os mesmos rostos. Uns vulgares, outros rachados pelo tempo, outros pintados, e mais outros refletindo a escassez e a miséria. Vi paredes de tintas gastas e sujas, postes com luzes fracas e poças de águas pelo chão. Não havia em mim certeza de nada, apenas desejo pelo desconhecido. 

Minha mala, mesmo com o tempo e a ação do cansaço devido as horas de caminhada começava a perder o peso alcançado, começava a me trazer mais alegria do que enfado ao perceber caminhos novos, sorrisos novos juntamente com novas arquiteturas o que me fazia ter ainda mais certeza de que era exatamente disso que meu coração precisava para bater novamente. Descobri novas cores e com elas novas combinações, percebi novos costumes e com eles o entendimento de cultura e suas diversidades, vislumbrei arco-íris no céu e borboletas nos jardins. 

Deixei meu casulo, me afastei de mim, busquei pelo que nem mesmo sabia existir e nesse processo encontrei um eu desconhecido, mas muito melhor do que todos os eus que já haviam se manifestado em mim ao longo dos anos aos quais vivi sem perceber que tinha o dom da vida, descobrindo assim que a melhor bagagem da vida é aquela que não cabe em uma mala. 

Um comentário:

  1. Coisa linda esse texto!!!
    Me fez lembrar a frase de uma camiseta que ganhei de aniversário: "A vida é uum presente de Deus a nós. O que fazemos dela é o presente que damos a Deus!"

    E que nossa vida seja assim: uma constante tentativa de retribuir a Deus este presentão que Ele nos deu. Que busquemos a cada dia, sair de nosso comodismo e buscar novas formas de viver!

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